domingo, 5 de março de 2017

Nós, Os Construtores


Somos construção momento a momento. Somos a soma de tudo o que fazemos, dia após dia, hora após hora. Viver no presente tira-nos por vezes a noção de como chegámos onde chegámos. Como fiquei tão triste? Como ganhei tanto peso? Como construí uma carreira profissional tão sólida? O tempo é um continuum. Todos os dias trabalhamos (ou não) para um fim. Cada ação ou cada inação, cada sacrifício ou cada negligência, cada palavra ou cada silêncio, tudo nos conduz a um lugar.
Quando lutamos por conquistar um determinado sonho ou objetivo, é importante não esquecer isto. Mesmo quando parece que não saímos do mesmo sítio, estamos a caminho. Se trabalhamos regularmente para algo, mesmo nas horas mais paradas, há coisas a acontecer. É o trabalho de bastidores, aquele que nem sempre é valorizado, porque não se vê. É tudo o que acontece a um nível micro, enquanto o nosso olhar se foca no nível macro.
Quando um bebé começa a andar, acumula em si milhares de pequenas experiências invisíveis. Milhares de pequenas conquistas, em que foi adquirindo força, confiança e destreza suficiente para tal. O mesmo acontece quando começa a falar. Dentro de si, o processo de aprendizagem começou no dia em que nasceu. Escutando o outro, processando a linguagem dentro de si, apreendendo o significado das coisas, silenciosamente. Um dia, manifesta-se. Também na prática de yoga acontece trabalharmos uma posição semanas e semanas sem ver evolução. Um dia, damos o salto. Na psicoterapia é igualmente assim que acontece. Trabalhamos, sessão a sessão, para um melhor entendimento de nós mesmos, da nossa vida, do nosso sofrimento. Sabemos que há coisas a mudar mas nem sempre nos parece possível chegar onde gostaríamos. É trabalhoso. Porém, se perseverarmos, um dia, numa determinada circunstância, desabrochamos. Damos por nós, pela primeira vez, a agir (ou reagir) diferentemente. “Nem me reconheço”, pensamos. Foi uma construção lenta, microtransformações acontecendo lentamente cá dentro que conduzem a um resultado só visível mais tarde, quando as condições ideais se reúnem. É a lógica da lagarta que se transforma em borboleta. A diferença é que ela se fecha para o mundo enquanto se dá a metamorfose, enquanto em nós as transformações não passam necessariamente pelo isolamento. Em nós, a transformação parece mais súbita, pois acontece enquanto vivemos as nossas vidas, mas a sua construção começou muito antes da sua manifestação.
É preciso, para isso, ter uma visão a longo prazo. Se procuramos os resultados rápidos, a recompensa imediata, tendemos a desistir. As verdadeiras conquistas demoram. O tempo das transformações sólidas é muitas vezes diferente da nossa urgência. É preciso ter serenidade e confiança no esforço e dedicação. É o trabalho que conduz ao sucesso. 

2 comentários:

  1. Oi Sofia! Cheguei ao seu blog quando buscava um poema da Matilde Campilho no Google (Fevereiro, que você transcreveu aqui). Que presente encontrar as suas reflexões, elas me tomaram em cheio!!Vou até levar um dos seus textos na terapia sessão que vem! :) Já favoritei o seu blog e vou acompanhá-la daqui pra frente. Gratidão pela generosidade da partilha e um abraço fraterno aqui dos trópicos.

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    1. Olá Luciana! Encontrei hoje as suas palavras, confesso que não sou muito atenta aos comentários. Que bom que os textos fizeram sentido e ajudaram a pensar um pouco desse lado do oceano. Um abraço,
      Sofia

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