domingo, 31 de janeiro de 2016

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Intervalo de Vinte Minutos Para Sonhar



 Passados quinze anos da entrada no séc. XXI, desenham-se com maior nitidez aqueles que são os grandes desafios e paradoxos da actualidade: olhamos cada vez mais atentamente as questões dos direitos humanos mas somos reféns de um mundo extremamente orientado para o dinheiro; intuímos que essa sociedade “devoradora” em grande parte nos conduziu a uma dívida que é hoje dona e senhora de nós mas não encontramos caminho fácil para consumir menos e/ou produzir mais; tentamos não esquecer de que somos uma espécie gregária enquanto nos debatemos com um isolamento tecnológico cada vez mais refinado; apregoamos a tolerância mas sentimos uma violência latente em pensamentos, palavras e actos em nosso redor (e por isso queremos abrir os braços a quem precise mas receamos abraçar um agressor).
Perante a força esmagadora desses desafios do mundo concreto, não podemos perder de vista a importância de um espaço que nos ajude a pensar e a sonhar. Esse espaço cria-se, nas sociedades, através das artes, da cultura e da educação — universo sensível. Esse universo sensível é também algo que liga as pessoas, na medida em que está muito enraizado na tradição europeia e é, de certa forma, uma identidade: pertencemos a um continente-berço de pensadores e de fortes movimentos artísticos e culturais. É também uma força: em tempos de fractura, tudo o que promova a coesão e a integração é de preservar.
Embora o nosso país seja hoje mais alfabetizado do que há muitos anos atrás e o acesso às artes e à cultura seja hoje feito sem censuras ou grandes limitações, há uma espécie de anestesia generalizada no que trata a políticas de apoio e crescimento nestas áreas. E um país que não investe na arte e na cultura é um país que embrutecerá rapidamente. Ali não frutificarão novas ideias, pois a criatividade é abortada à nascença, com os habitantes adormecidos entre extratos bancários e folhas de cálculo. O ser humano não vive só de números mas também de sonho. É fácil cair na tentação de colocar as artes e a cultura num plano secundário: o que importa é pagar as contas e ter comida na mesa. Porém, se não se despertam os sentidos, a alma definha. As artes e a cultura são o alimento do espírito de um povo: para além da possibilidade de se maravilhar, é nesse espaço de sonho que podem surgir pensamentos críticos. É, como diria Raul Brandão, um “intervalo de vinte minutos para sonhar”.
As artes e a cultura, seja sob a forma de música, de pintura, de literatura, de cinema, de teatro ou de qualquer outra manifestação de criatividade, são porta de entrada do pensamento divergente, e assim o mundo “pulula e avança”. Ao mesmo tempo, permite um certo encantamento que nos distrai da realidade, por vezes tão dura. Sobre isso já Nietzsche dizia que “temos a arte para não morrer da verdade”. De facto, lemos as notícias ou ouvimos os telejornais e somos imediatamente sufocados com doses maciças de realidade. Não precisamos nem devemos fugir da realidade, ou seja, não se trata de oferecer “circo e bolos para enganar os tolos”, trata-se sim de reservar espaço na nossa mente para aquilo que é belo: seja lá o que isso for para cada um de nós.


terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Confiabilidade


Todos os seres humanos são dotados de uma tendência inata ao desenvolvimento/crescimento. Mas, embora inata, a tendência por si só não basta, nem a mera passagem do tempo. Trata-se de uma tendência mas não de uma determinação, ou seja, as coisas não acontecem necessariamente assim. Para que essa tendência venha a realizar-se, dependemos, antes de mais nada, de um ambiente facilitador e promotor do bom desenvolvimento nos primeiros anos das nossas vidas. Para além do amor, alimento mais básico, há a necessidade de um ambiente seguro, que é como quem diz: confiabilidade.
Confiabilidade é uma dessas coisas que valem ouro. Dizemos que uma pessoa é confiável quando sabemos que é possível contar com ela. Quando uma pessoa é confiável acreditamos que fará o que lhe compete, o que prometeu e aquilo com que se comprometeu. E sabemos que não fará mau uso do que lhe confiamos (seja um segredo, uma tarefa ou a nossa própria vida). A confiabilidade implica também uma certa previsibilidade: uma coerência que não abala à mais pequena brisa. É destas pessoas e deste ambiente que precisamos para nos sentirmos seguros e podermos dar asas ao nosso potencial de expansão. E precisamos tanto mais disto, quanto mais dependentes somos (ou estamos). É por isso que a confiabilidade adquire uma importância vital no início das nossas vidas: Quais as primeiras marcas que o mundo deixa em nós? É um local seguro ou assustador?
É que é preciso perceber que o bebé humano, ao contrário do bebé animal, vem ao mundo com uma certa prematuridade, sendo “lançado às feras” muito antes de poder ser minimamente autónomo. Então, pobres de nós que estamos à mercê do outro se o outro não for confiável — se não sabemos o que esperar, se não sabemos com o que contar. Há ambientes que deixam o bebé entregue à imprevisibilidade. Há ambientes que deixam os bebés assim inseguros, e portanto, entregues aos seus próprios recursos, ainda tão parcos: nesses casos, a criança experienciará vivências de desamparo, por vezes da ordem do insuportável. Se a criança nunca sabe se pode contar com a resposta adequada no momento adequado, e se isso exceder o que é capaz de suportar, a sensação será da ordem do aniquilamento.  Naturalmente, embora a vida prossiga o seu rumo, na melhor das hipóteses não escaparemos de uma existência cheia de ansiedade e angústias. Teremos que nos organizar para subsistir sozinhos pois não pudemos contar com o meio que nos envolveu. O perigo incide, sobretudo, se este for o cenário recorrente: uma criança que está sistematicamente entregue a si mesma pode ver o seu desenvolvimento severamente comprometido.

 Para nos podermos dedicar às nossas tarefas de crescimento e de exploração do mundo, não podemos estar preocupados com o que nos pode acontecer. Precisamos de confiar, pela repetição de experiências positivas, que haja o que houver, a dormir ou acordados, o mundo olha por nós, acompanha as nossas necessidades, e permanece presente, vivo, atento, disponível e confiável. Se tudo correr bem, a autonomia conquistar-se-á sem medos e enfrentaremos a vida com confiança. A confiança nasce dentro de quem, desde sempre, pôde confiar.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Terapia



O ano começa com uma estreia interessante: Terapia, na RTP1, uma adaptação portuguesa de uma série israelita (que chegou ao grande público principalmente após a versão da HBO, In Treatment). Todos os dias, uma sessão por dia. O dos EUA tinha muita qualidade técnica e artística e esperemos que o nosso não fique atrás. Bom ano!