sábado, 30 de julho de 2011

Pedrinha (de Santo Agostinho)

Afinal, a psicanálise não é só feita de palavras, é feita de afectos, de emoções, de relação. É que sem isso, para parafrasear Santo Agostinho, palavras são apenas palavras, ou seja, o som e o ruído das palavras. Falar é outra coisa.

Carlos Amaral Dias

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Lendo nas entrelinhas


A leitura é actualmente considerada uma ferramenta insubstituível e indispensável, que permite aos indivíduos aceder, vida fora, a uma grande quantidade de experiências e conhecimentos. É primordial no processo de aprendizagem e no sucesso escolar/profissional e, como tal, os estudos sobre esta competência têm surgido e proliferado significativamente nas últimas décadas, conduzindo inclusivamente a algumas medidas que revelam, pelo menos, alguma sensibilidade ao tema, como, por exemplo, a implementação do Plano Nacional de Leitura (PNL).
Tornou-se imperativo, ao longo dos tempos, compreender os modelos de aquisição de leitura e os processos segundo os quais tudo acontece, bem como analisar as metodologias de ensino à luz desse conhecimento, de modo a poder agir mais adequadamente. De uma maneira geral, os estudiosos realçam de forma unânime a existência de duas vertentes na leitura: a descodificação e a compreensão. O que caracteriza o processo de descodificação é o conhecer e distiguir visualmente e auditivamente as letras, relacioná-las com os sons que representam, juntar grafemas formando palavras e identificá-las e pronunciá-las como entidades globais. Em suma, a descodificação implica a transformação dos grafemas em fonemas, identificando e reconhecendo palavras utilizadas correntemente na comunicação entre indivíduos. Por sua vez, a leitura de compreensão é um processo posterior à descodificação e, ainda, bem diferente nas suas características e objectivos. O objectivo é permitir ao indivíduo ler palavras, frases e textos, para lhes extrair um significado, interpretando, apreciando e servindo-se da sua mensagem para adquirir e criar conhecimento. As palavras deixam de ser consideradas e interpretadas isoladamente, e passam a ser perspectivadas como partes integrantes da frase e do texto, onde têm a sua função e adquirem significado específico. Assim que dominamos as técnicas de descodificação, pômo-las, agora, ao serviço da compreensão da mensagem escrita, que depende, também, do nosso desenvolvimento linguístico e capacidades cognitivas.
As dificuldades na aquisição da leitura continuam a ser uma das principais causas das retenções no 1º Ciclo (e do encaminhamento dos alunos para Serviços de Psicologia e Orientação). Este insucesso influencia, por vezes de uma forma decisiva, a aprendizagem em inúmeras outras áreas disciplinares, para as quais o domínio desta competência é fundamental. Não raras vezes condiciona o percurso escolar do aluno e, consequentemente, desencadeia e alimenta um conjunto de efeitos negativos, como o desinvestimento face à aprendizagem, problemas comportamentais e afectivos. E assim sendo, é necessário que estas situações sejam sinalizadas e avaliadas de forma a desenvolver intervenções eficazes e contornar, de raiz, uma das principais causas do insucesso escolar.

Insights

Primeira noite de Verão



Comecei a escrever numa noite de Primavera, uma incrível noite de vento leste e Junho. Nela o fervor do universo transbordava e eu não podia reter, cercar, conter – nem podia desfazer-me em noite, fundir-me na noite. (...)

Sophia de Mello Breyner Andresen  

terça-feira, 26 de julho de 2011

Poema


Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.

Manuel António Pina, in "Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma é Apenas um Pouco Tarde"

domingo, 24 de julho de 2011

Beautiful People


The most beautiful people we have known are those who have known defeat, known suffering, known struggle, known loss, and have found their way out of the depths. These persons have an appreciation, a sensitivity and an understanding of life that fills them with compassion, gentleness, and a deep loving concern. Beautiful people do not just exist.

Elizabeth Kübler-Ross

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Coisas Boas (The sweetest thing)

Psiquiatras, Psicólogos, Psicoterapeutas e Psicanalistas


Existe, não raramente, alguma confusão relativamente às diferenças entre um psiquiatra, um psicólogo, um psicoterapeuta e um psicanalista. Embora sejam, todos eles, profissionais de saúde mental, há diferenças ao nível da formação académica, da compreensão das situações clínicas, bem como no que respeita às intervenções terapêuticas.
O psiquiatra é um profissional formado em Medicina e com posterior especialização em Psiquiatria. O conhecimento do psiquiatra concentra-se fundamentalmente no diagnóstico de comportamentos desviantes. Utiliza como linha de base um sistema de classificação e diagnóstico baseado em manuais (ex: DSM-IV – Manual Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais) e a principal forma de intervenção utilizada por estes profissionais é a prescrição de medicamentos como antidepressivos, ansiolíticos e outros psicofármacos.
O psicólogo é um profissional formado em Psicologia, a quem compete o estudo do funcionamento humano, bem como a avaliação e tratamento das perturbações associadas. A sua área de intervenção foca-se no indivíduo e nos seus processos internos, mas pressupõe também uma compreensão alargada do seu funcionamento familiar e social, intervindo também no ambiente envolvente. A formação em Psicologia é tão diversa que se divide, quase de início, na área clínica, organizacional, educacional ou criminal. O conhecimento do psicólogo pode, assim, aplicar-se a uma série de áreas da sociedade, consoante a sua formação (neste caso, saúde mental, organizações e empresas, escolas e agentes educativos ou área forense, entre inúmeras outras relacionadas). Quando se dedica à área clínica (aquela que serve a nossa comparação), em particular, o psicólogo tem legitimidade de realizar uma série de intervenções psicológicas mas, em situação de consultório e prática clínica, deve continuar a sua formação e especializar-se como psicoterapeuta para uma intervenção mais ética e eficaz com os pacientes. 
O psicoterapeuta domina um corpo de técnicas que utilizam métodos psicológicos para analisar e intervir em estados emocionais, comportamentais e outras perturbações causadoras de mal-estar físico, psicológico ou social e de outras problemáticas por vezes menos evidentes. Na psicoterapia, através de uma relação muito particular que é estabelecida entre os dois intervenientes conduz-se o paciente numa viagem em que este se torna mais consciente de Si (do que faz, pensa e sente) e através da qual se pretende aliviar algum sofrimento e proporcionar a mudança. Importa realçar que, embora a psicoterapia derive de teorias psicológicas, um psiquiatra com formação adicional nesta área (e não apenas formação médica) pode, também, utilizar a técnica.
O psicanalista é um profissional com uma especialização em psicanálise (normalmente um psicólogo ou um psiquiatra, que faz, posteriormente, formação adicional em psicanálise). A teoria e técnica da psicanálise têm nuances particulares que exigem uma formação prolongada por parte do profissional (o próprio processo psicanalítico é longo e aprofundado) em entidades competentes. Visa o desenvolvimento da capacidade de pensar analiticamente sobre si próprio e sobre o mundo e proporciona uma notável expansão e crescimento do sujeito. O psicanalista (ou analista, forma abreviada) opera igualmente em contexto clínico, intervindo com a sua técnica, a psicanálise (ou análise), que se assemelha em alguns pontos a uma psicoterapia, embora tenha particularidades muito específicas.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Liberdade

Quem prende a água que corre,
É por si próprio enganado;
O ribeirinho não morre,
Vai correr por outro lado.

António Aleixo (Quadras Populares)

sábado, 16 de julho de 2011

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Pedrinha (Da concavidade)


A concavidade não se diz, não se anuncia, pertence ao lugar bom do não dito; sente-se, pressente-se e tem uma magia – quanto mais se dá lugar ao outro, mais se tem lugar para ele. Talvez a concavidade seja a capacidade de amar.

Maria João Saraiva (Até mim: vivência da psicanálise)

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Pensar os pensamentos

Mesmo suponho a existência de um aparelho de pensar os pensamentos bastante eficaz, mesmo assim, existem ainda muitos pensamentos que o sujeito não é capaz de pensar sozinho e que são colocados no interior do analista para ele pensar. Uma das principais funções do analista é pensar aquilo que o analisando não é capaz de pensar.

Carlos Amaral Dias (Freud para além de Freud)

terça-feira, 12 de julho de 2011

Quente

Pedrinha (Das falsas verdades)

Então, diz coisas deste tipo: “não me deixou marca”, “não era uma criança dada a dramas”, “não sou uma pessoa romântica”. Nada disto é verdade, mas ele pensa assim, pois foi assim que organizou a sua autobiografia: depurou-a, ou amputou-a, do conteúdo emocional perturbador, do sabor amargo ou do molho picante.

António Coimbra de Matos
07.11.2010

domingo, 10 de julho de 2011

Pedrinha (Do reinventar)


O amor é coisa fugidia     
Mas recria-se dia a dia

António Coimbra de Matos (Sintra, 1950)

sábado, 9 de julho de 2011

Vai onde te leva o coração


A escolha de uma área profissional é um dos momentos mais importantes no percurso escolar de um jovem. Chegando ao 9º ano de escolaridade, o adolescente vê-se a braços com uma decisão relativa à área de estudo que pretende aprofundar durante os seguintes anos de aprendizagem. É o momento da primeira escolha.
 Naturalmente, nem todos os jovens sabem com a mesma determinação aquilo que querem para a sua vida. É frequente existirem indecisões, angústias e receios. Nessa altura, recomenda-se que o aluno realize provas de orientação vocacional, que o ajudem a esclarecer alguma dúvida bem como a tomar uma decisão mais madura e consciente. E recomenda-se mesmo aos jovens mais “esclarecidos” pois, independentemente de parecer que o adolescente sabe muito bem aquilo que quer, não podemos esquecer que está em plena processo de construção da sua identidade e que esse processo nunca é uma equação simples.
O objectivo fundamental da realização destas provas é a recolha de dois tipos de informação fundamental, os interesses e as aptidões. Os interesses dizem respeito às áreas pelas quais o jovem sente maior motivação e gosto e também aos seus sonhos relativamente à sua realização profissional. As aptidões estão relacionadas com as suas reais capacidades em cada uma das possíveis áreas de escolha. Seguidamente, há toda uma panóplia de factores que devem ser analisados conjuntamente pelo jovem e psicólogo durante a entrevista, tais como a existência de algumas discrepâncias entre as aptidões e os interesses, as suas expectativas e os seus receios, a qualidade da informação que o adolescente possui relativamente aos cursos e ao mercado de trabalho e, ainda, não raras vezes, perceber se alguns desejos (nem sempre explícitos) dos pais estão ou não a criar ambivalência no jovem.
Seguindo em frente, uma nova escolha, semelhante a um estreitamento, é exigida no final do 12º ano de escolaridade. Uma escolha específica. Para além das dificuldades apontadas anteriormente, inerentes a qualquer processo de decisão, aqui se reúnem outro tipo de dúvidas, nomeadamente a questão das médias/requisitos de entrada na Universidade, uma grande oferta de Universidades (ou cursos de outra ordem, nunca esquecendo a quantidade de jovens que preferem outro tipo de especialização), as saídas profissionais, ou mesmo a pressão sentida quando não sabem ainda ao certo qual a actividade profissional em particular que querem escolher.
As variáveis emocionais são de grande importância porque, para que o aluno obtenha sucesso académico numa dada área, é necessário que exista, para além dum investimento intelectual, um investimento afectivo e emocional que funcione como catalisador da vontade de aprender. E uma situação de indecisão não é sinónimo de fracasso ou desinteresse no futuro, havendo sempre a alternativa de recorrer a técnicos especializados que poderão iluminar alguns recantos escuros nesta importante fase de vida.

domingo, 3 de julho de 2011

Coisas de amigos


Tinha-se perdido de si mesma, mas a sua amiga sempre soubera qual era o lugar dela, o valor dela e não saiu de perto enquanto ela não voltou a reconhecer-se através do olhar da amiga, do seu afecto; primeiro, ela era só um punhado de dúvidas, depois foi sendo capaz de reconhecer os seus contornos, naquilo que a sua amiga lhe dizia e, mais além, preenchendo esses contornos com bocados de vida sua; foram tempos em que, “cega” a si própria, se foi buscar ao interior de quem a fazia existir, de quem a fazia existir tão perto do que era ela. E a amiga nunca saiu de lá, sempre a fazê-la sentir o valor que a vida dela tinha, o quanto ela era valiosa, nunca saiu de lá até estar segura de que ela já se reconhecera e já se encontrara; aí sim, sabia que, embora ainda “descalça”, iria fazer caminho. Nunca saiu de lá; mesmo agora, que voltava.

Maria João Saraiva (in Até mim: Vivência da Psicanálise)